Tantas mudanças acontecidas a partir da chegada ao Rio de Janeiro dos novos moradores, em 1808, eram percebidas pelos viajantes que visitavam a cidade. Melhorias acontecidas contando, inúmeras vezes, com a contribuição daqueles habitantes que, dispondo de recursos, recebiam em troca benefícios materiais e títulos de nobreza do regente D. João (1767-1826). Afinal, ser amigo do rei e circular na intimidade da corte era um desejo acalentado por muitos.

A cidade fundada por Estácio de Sá em 1565, agora cenário real, passava por melhorias conduzidas pela Intendência Geral de Polícia. Entre elas, estavam ruas da cidade como a Rua do Ouvidor, não por ter melhor calçamento e limpeza, mas porque ao longo dessa artéria concentrava-se, com fisionomia europeia, o que era entendido como a moda mais refinada. Os viajantes que retornavam ao Rio de Janeiro percebiam as transformações. Um deles, o médico e botânico George Gardner (1812-1849), diria que a Ouvidor ganhava importância, luxo e luzes. O escritor Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882), mais adiante, em crônica, a descreveu como “elegante e vaidosa”. Machado de Assis (1839-1903) comentou que se o Rio de Janeiro tivesse um rosto, “este seria a Rua do Ouvidor”.

O comércio de lá ofertava as tendências elegantes vigentes nas cortes do Velho Continente (Europa). Atraía damas e cavalheiros distintos e abastados, que sabiam de cor a cartilha do requinte: os franceses estavam sempre um passo à frente. Esse seleto grupo, pretendendo ser também requintado, deveria comportar-se de acordo com o conceito civilizatório que permeava a época. E a moda europeia era um indicativo dessa postura.

O ser e o parecer se confundiam nessa corte de cenários. A parcela dos bem-nascidos utilizava-se da indumentária como forma de marcar distância dos despossuídos e da escravidão. O espelho da elegância refletia a alta nobreza europeia: reis, rainhas, príncipes e princesas. Mais do que tendência, vestir-se como os poderosos mostrava status, origem, classe social. Era o indicativo de pertencer a um grupo seleto e diferenciado.

Relatos de época, feitos por viajantes europeus, demonstram certo espanto com as roupas e os modos da elite colonial, que, frequentemente, pecava pelo excesso, tentando provar fidalguia a qualquer custo. E essa não era uma tarefa simples. Mesmo nos meses de verão, os cavalheiros que circulavam pelo Rio de Janeiro não abriam mão de um tipo de jaqueta ou de um casaco cruzado com três botões, geralmente confeccionado em tecido inglês para o inverno europeu. Inúmeras peças femininas, usadas em casa sobre as camisolas, eram designadas em francês como négligé-chambre e peignoir.

As elegantes senhoras e senhoritas, vestidas da cabeça aos pés, portando uma capa que podia ser de lã, saíam de casa sempre acompanhadas dos pais, dos maridos ou dos irmãos e de suas mucamas. Enfrentavam as altas temperaturas cariocas e, possivelmente aflitas, deveriam refletir sobre como era difícil tentar ser francesa em terras tropicais, à sombra das palmeiras, ouvindo o canto dos sabiás.