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Cabeçalho do jornal Bem Te Vi, que representava a população insatisfeita com os abusos do governo, dos comerciantes portugueses e dos senhores de terra. Domínio público, Biblioteca Nacional Digital

Durante o Período Regencial, o reconhecimento da Independência do Brasil ainda produzia tensões no Maranhão. A política da província era marcada por disputas entre os bem te vis e os governistas, chamados pejorativamente de cabanos. A Balaiada começou a partir dos choques entre esses dois grupos, mas em pouco tempo ganhou autonomia, tornando-se um movimento das massas sertanejas.

Segundo Caio Prado Júnior, "na origem deste levante, vamos encontrar as mesmas causas que indicamos para as demais insurreições da época: a luta das classes médias, especialmente urbana, contra a política aristocrática e oligárquica das classes abastadas, grandes proprietários rurais, senhores de engenho e fazendeiros, que se implantara no país".

O grupo bem te vi, nome tirado do jornal Bem Te Vi, representava a população urbana que se opunha aos abusos dos proprietários de terras e aos comerciantes portugueses. Os conflitos entre bem te vis e cabanos agravaram-se após a votação da chamada "lei dos prefeitos", pela qual os governantes locais, os prefeitos, passaram a ter poderes imensos, inclusive o de autoridade policial. Os cabanos, que estavam no poder, conseguiram maior controle da província, nomeando seus partidários para o cargo de prefeitos, o que redundou em perseguição aberta aos bem te vis.

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Negros carregadores. A maior parte da população do Maranhão era negra e fugia para os quilombos para escapar dos maltratos de seus senhores. Grafite aquarelado de François-René Moreaux, século XIX. Domínio público, Biblioteca Nacional Digital

No Maranhão, a insatisfação social era grande. Negros e mestiços constituíam a maior parte da população. Como aponta o historiador Arthur César Ferreira Reis, "milhares de negros que fugiam aos maltratos dos senhores aquilombavam-se nas matas, de onde saíam para surtidas rápidas e violentas sobre propriedades agrárias". O movimento logo escapou do controle das camadas dominantes, transformando-se num levante dos setores mais humildes da província.

O fato que costuma marcar o início da revolta ocorreu em dezembro de 1838, quando o vaqueiro Raimundo Gomes, um mestiço conhecido como Cara Preta, passava pela Vila da Manga, levando uma boiada de seu patrão para vender em outro local. Na ocasião, muitos dos homens que o acompanhavam foram recrutados e seu irmão, aprisionado sob a acusação de assassinato.

O recrutamento obrigatório, uma das armas de que o governo dispunha para controlar a população, sempre foi muito impopular, visto que recaía basicamente sobre os menos favorecidos, obrigados a qualquer momento a servir nas forças policiais ou militares. Raimundo invadiu a cadeia, libertando não só seu irmão como os outros presos. A guarda não reagiu. Ao contrário, aderiu.

A partir daí o movimento ampliou-se. A luta generalizou-se por toda a província. Por onde passava, Raimundo ia conseguindo que mais gente o seguisse, inclusive os escravos negros, que formaram quilombos, dos quais o mais importante foi o comandado pelo negro Cosme. À frente de três mil escravos rebelados, Cosme, um antigo escravo que se intitulava "Imperador, Tutor e Defensor das Liberdades Bem te vis", vendia títulos e honrarias a seus seguidores.

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Estátua em homenagem ao vaqueiro Raimundo Gomes Vieira, um dos líderes populares da Balaiada, na cidade de Caxias, no Maranhão. Foto de Kristiano Simas. Uso amparado pela Lei 9610, Agência Assembleia

Em 1839, os balaios tomaram a Vila de Caxias, "a segunda cidade da província em importância". Pelas ruas da Vila ouvia-se:

"O Balaio chegou!
O Balaio chegou.
Cadê branco!
Não há mais branco!
Não há mais sinhô!"

Os rebeldes organizaram-se em um Conselho Militar e formaram uma Junta Provisória, com a participação de elementos bem te vis da cidade. Uma delegação foi enviada à capital, São Luís, para entregar ao presidente da província as propostas para a pacificação: anistia para os revoltosos, revogação da "lei dos prefeitos", pagamento das forças rebeldes, expulsão dos portugueses natos e diminuição de direitos dos naturalizados e instauração de processo regular para os presos existentes nas cadeias.

No entanto, o movimento, apesar de ter atingido a parte mais importante da província, chegando mesmo a ameaçar São Luís, entrou em rápido declínio. Sem unidade, com muitas divergências entre seus chefes, sofreu ainda o afastamento dos bem te vis, que, após tentarem tirar vantagens do movimento, dele se afastaram, aderindo à reação, com medo da radicalização das camadas mais pobres da população, que assumiram a liderança da revolta.

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Ruínas do quartel, em Caxias (MA), a partir de onde o então coronel Luís Alves de Lima e Silva comandou a repressão aos revoltosos. Foto de Kristiano Simas. Uso amparado pela Lei 9610, Agência Assembleia

Não aceitando as exigências dos balaios, o governo provincial solicitou ajuda ao Rio de Janeiro. Em 1840, o coronel Luís Alves de Lima e Silva, futuro Barão de Caxias, é nomeado para a presidência da província, acumulando o comando das armas. À frente de oito mil homens, e aproveitando-se habilmente das rivalidades entre os líderes balaios, Caxias em pouco tempo sufocou o movimento. No ano seguinte, em 1841, um decreto imperial concedeu anistia aos revoltosos sobreviventes. Ao entregar o governo do Maranhão a seu substituto, em 13 de maio de 1841, Caxias dizia: "Não existe hoje um só grupo de rebeldes armados, todos os chefes foram mortos, presos ou enviados para fora da província".

A repressão à Balaiada marcou o início da chamada "política da pacificação", pela qual Caxias sufocou as agitações que ocorreram durante o Império.