A distinção que os jovens fazem entre o mundo on-line e o off-line e o impacto que tais percepções promovem na sociedade e na educação foram os pontos que nortearam o desenrolar do debate realizado na manhã do segundo dia do seminário A Escola, as Mídias e a Cultura Digital, promovido pela MultiRio como parte das atividades comemorativas de seu 20º aniversário. Para uma das integrantes da mesa, a educadora Andrea Ramal, da ID Projetos Educacionais, a escola atual ainda é aquela que foi formulada para existir totalmente voltada para o mundo off-line e precisa se reformular para se tornar mais atrativa aos jovens, que, na opinião dela, acham o mundo on-line mais divertido e interessante. Já para Alberto Tornaghi, da Universidade Estácio de Sá e coordenador da escola Oi Kabum!, não há necessidade de existir um “corte epistemológico” entre a educação dos mundos off-line e on-line. “Esse corte só existirá se a gente quiser”, opinou ele.
Na opinião de Andrea Ramal, a escola precisa construir uma reflexão crítica sobre a cibercultura, principalmente em relação à sua lógica imediatista – de tudo ser resolvido com um clique – e descartável/deletável – de nada ser consertado, tudo ser jogado fora. Ao mesmo tempo, para ela, a escola precisa entender que não pode mais ser tão conteudista, pois, hoje, quem acumula os dados são os suportes tecnológicos e não o cérebro humano. “O cérebro tem que ser usado para outras coisas e o currículo tem que ser mais hipertextual”, defendeu Ramal, para quem não é mais possível que um professor de Literatura ensine trovas medievais, quando o professor de História da mesma turma está ensinando Segunda Guerra Mundial. “É fundamental fazer as interconexões, não dá mais para o currículo ser tão linear”, opinou a educadora.
A interconexão da educação com outras redes cooperativas também é, para ela, outra questão que a escola precisa entender que tem que mudar. “Tem que trazer a família para a escola. Não é mais possível promover uma educação desconectada com os valores. Família e escola precisam formar juntas”, defendeu Andrea Ramal. Para ela, a escola também deve se inserir na lógica digital. "Essa lógica não é a panaceia de fazer apostilas com efeitos digitais ou usar o Excel para dar notas. É preciso rever o conceito de professor, para que ele seja um arquiteto cognitivo que transforme a sala de aula numa rede cooperativa”, explicou.
Alberto Tornaghi, contudo, acredita que não é possível fazer generalizações sobre a realidade sociocultural do Brasil e do mundo. “O que é um nativo digital? Eu coordeno uma escola, a Oi Kabum!, que atende jovens em situação de risco, com famílias de baixo poder aquisitivo. Esses jovens de 15 anos se inserem nesse modelo em que se criam conectados à internet a maior parte do dia? Não se pode generalizar. Por isso, prefiro falar em produção de jovens para jovens”, posicionou-se. Tornaghi ainda afirmou que, na Oi Kabum!, há um forte compromisso com os conteúdos da grade curricular. A diferença é que ela não é voltada para o Enem, mas para o trabalho, pois para esses jovens ter perspectivas de trabalho é muito importante para saírem da situação de risco. “É possível fazer uma escola com compromisso com a grade curricular, voltada para o interesse do aluno”, defendeu ele.
Novo modelo em construção – Para Rosália Maria Duarte, professora do Departamento de Educação da PUC-Rio, que também integrou a mesa de debate, a intensidade do uso das tecnologias é uma escolha individual. “Há uma onipresença das mídias nas relações macrossociais. Mas essa onipresença só ocorre em função da adesão privada, doméstica, cotidiana”, disse. Segundo ela, era mais fácil construir paradigmas no modelo de comunicação anterior, quando o poder hegemônico passava sua visão de mundo para o diverso por meio das grandes redes de comunicação. A construção de um modelo ético onde o diverso tenha maior poder é mais difícil. Aliás, de acordo com Rosália, esse novo modelo ainda está em construção.
A professora tem, inclusive, uma perspectiva otimista. “As escolhas individuais alteram a lógica planetária e temos visto isso acontecer nas manifestações de rua, que têm ocorrido em todo o mundo. Hoje, o jovem usa a internet para fazer política de uma forma mais oxigenada que na minha época, quando só se discutia poder econômico. Dessa nova forma de comunicação tem emergido a crítica à família, às relações amorosas”, falou Rosália, para quem o mundo off-line e o on-line têm forte conexão.