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E.M. Herbert Moses inaugura Memorial Lembrar É Resistir
28 Maio 2018 | Por Márcia Pimentel
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O cerimonial de inauguração: componentes do cortejo chegaram de limusine. Foto Alberto Jacob Filho, 2018, MultiRio

Foi com pompa e circunstância, com direito a limusine, tapete vermelho, cortejo e música da Orquestra Manoel Congo, formada por alunos da escola, que a E.M. Herbert Moses (4ª CRE) inaugurou, em 16 de maio, o Memorial Lembrar É Resistir, em homenagem aos mais de 12 milhões de escravos africanos que chegaram às Américas. A inauguração foi a culminância do projeto Qual É a Graça?, que transformou o comportamento dos estudantes da unidade escolar, antes imersos em brigas diárias provocadas por bullying de caráter racista e por rixas de gangues.

Encabeçado pelo professor de Ciências, Luiz Henrique de Melo Rosa, o projeto foi iniciado em 2008, quando ele tomou conhecimento da rebelião de escravos conhecida como Revolta de Vassouras, ocorrida em 1838 na cidade homônima do Vale do Paraíba fluminense. O levante terminou em tragédia, com o enforcamento, no ano seguinte, de seu líder, Manoel Congo, que, pouco antes de morrer, expôs seu maior sofrimento e preocupação: “Como minha filha Concórdia vai saber que eu não a abandonei?”.

Jardim da Concórdia

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Um setor do Jardim da Concórdia. No muro, símbolos adinkras. Foto Alberto Jacob Filho, 2018, MultiRio

Tocado com a dimensão humana do drama vivido pelo líder da revolta, o professor prometeu a si mesmo que Concórdia saberia que não foi abandonada pelo pai, ainda que isso só pudesse ocorrer de forma simbólica. Ao relatar o fato histórico em sala de aula, perguntou se alguém tinha alguma ideia de como homenagear a menina, que na época do enforcamento de Manoel Congo, tinha apenas 5 anos, idade que Luiz Henrique pôde constatar ao ver sua certidão de batismo na cidade de Paty do Alferes. “Podíamos fazer um lindo jardim para ela”, sugeriu uma aluna.

A ideia agradou ao professor de Ciências. Afinal, Jardim da Concórdia era um nome sugestivo, que vinha pedagogicamente a calhar em uma escola que precisava ultrapassar seus problemas de violência interna. A partir dele, diversos conceitos poderiam ser trabalhados: da dimensão histórica às questões humanas envolvidas na saga de Manoel Congo e sua filha, da problemática vivida pelos afrodescendentes (maioria dos alunos da escola) à paternidade responsável... Além disso, plantas e árvores poderiam atravessar os conteúdos de diversas disciplinas.

Qual É a Graça?

Foi assim que o Jardim da Concórdia virou objeto central do projeto Qual É a Graça?. “Batizei-o com esse nome porque com ele eu podia questionar vários eventos que aconteciam na escola: Qual é a graça de fazer piada com um grupo humano que foi sequestrado de sua terra natal e torturado em nosso país? Qual é a graça de magoar os outros?”, exemplifica Luiz Henrique.

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O professor Luiz Henrique, mentor do projeto. Ao fundo, a Orquestra Manoel Congo, dirigida pelo professor Daniel Garcia (de blusa listrada, à direita) Foto Alberto Jacob Filho, 2018, MultiRio

O início não foi fácil. Além da descrença na proposta, o que se plantava no Jardim da Concórdia era recorrentemente destruído. Mas o professor e alguns dos alunos que abraçaram o projeto não desistiram. Plantavam tudo de novo. E, aos poucos, foram vencendo a batalha de natureza, sobretudo, pedagógica. Afinal, qual é a graça de matar plantas, destruir o que os outros constroem...?

Gradualmente, vários professores e alunos aderiram ao projeto e à sua abordagem, até que a escola inteira o adotou. E depois de incontáveis perguntas, diálogos e discussões sobre qual era a graça de inúmeros atos de agressão e de desrespeito que ocorriam, a escola passou a viver um ambiente de paz interna. Há, inclusive, depoimentos de vários alunos, reconhecendo a mudança comportamental que tiveram a partir do projeto, como se poderá constatar no vídeo, no fim desta página. “Nosso lema é não perder nenhum aluno para a violência”, afirma Luiz Henrique.

Árvore da Memória

O Memorial Lembrar É Resistir é composto, principalmente, pelo Jardim da Concórdia, que hoje ocupa a maior parte do espaço livre externo da E.M. Herbert Moses, que fica no Jardim América e tem 1.080 alunos do 7º ao 9º ano e do Peja. As plantas contam fatos da História do Brasil e da colonização – como o pau-brasil, a seringueira, as árvores das especiarias obtidas nas Índias –, além de centenas de outras que servem às aulas de Artes, Ciências, Literatura... A de Língua Portuguesa, por exemplo, garante que todos da escola saibam que jiló é escrito com “j”.

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A inauguração do memorial culminou com a colocação, em torno da Árvore da Memória, das últimas das 12 milhões de pedrinhas do Jardim da Concórdia. Foto Alberto Jacob Filho, 2018, MultiRio

O memorial conta também com uma pequena exposição de objetos que remetem à escravidão e por um espaço dedicado à África, com plantas semeadas dentro de pneus que representam cada país do continente e que, juntos, formam o desenho de uma espiral. Em seu centro, há um pé de ipê branco, batizado de Árvore da Memória. Esse nome foi colocado em alusão e oposição à Árvore do Esquecimento, considerada mágica no Benin, e em torno da qual os escravos tinham que dar voltas para se esquecerem de tudo (de seus nomes, sua família e terra natal), antes de embarcar nos navios negreiros.

No muro que margeia a espiral, também foram pintados o mapa da África e alguns símbolos adinkras – ideogramas utilizados por várias tribos da costa oeste do continente. E amarrando o conjunto do memorial, cerca de 12 milhões de pedrinhas de cascalho espalhadas entre as plantas do Jardim da Concórdia, simbolizando o total de escravos que chegaram às Américas. Afinal, segundo o professor, Lembrar É Resistir.

Saiba mais sobre o projeto Qual É a Graça? no vídeo abaixo, da série Ensinar e Aprender.

 
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