Em plena era da Sociedade do Conhecimento, a utilização das tecnologias de informação e comunicação (TICs) na educação é uma realidade. Com a evolução tecnológica, novas possibilidades de ensino estão surgindo, em especial para a Matemática – uma variedade de games vem turbinando o aprendizado da ciência do raciocínio lógico e abstrato, por meio da ludicidade pedagógica no espaço mais importante de qualquer escola: a sala de aula.
Quem saiu na frente foi Naira Cristina Vieira Lemos de Oliveira, que apostou nos games educativos como ferramenta para melhorar o desempenho de seus alunos da Escola Municipal Alzira de Araújo (9ª CRE). Há mais ou menos 13 anos, durante as aulas da especialização em Educação Matemática, ela teve sua curiosidade aguçada para a questão.
– Nessa época, discutíamos diferentes maneiras de ensinar a matéria e pensávamos em como tornar essas aulas mais prazerosas, como desmistificar a imagem negativa que alguns alunos tinham da disciplina. Lecionava há apenas dois anos e buscava uma "fórmula mágica" para conquistar os alunos, em favor da disciplina, e melhorar a qualidade das aulas. Acreditava que esta fórmula existia. Foi aí que comecei a levar ludicidade para as aulas de Matemática, no Ensino Fundamental II. Antes, eu achava que o uso da ludicidade funcionava apenas com os menores. Comecei levando jogos de tabuleiro, todos envolvendo as temáticas das aulas. Espantei-me quando percebi que os alunos curtiram muito. Percebi que renovar o repertório de jogos sozinha seria quase impossível, e passei a incentivar a construção de jogos pelos próprios alunos. Acabamos criando juntos jogos matemáticos variados, com embalagens, logotipos e até regras – contextualiza Naira.
Responsável por uma das experiências no uso de jogos eletrônicos em sala de aula de maior êxito na Rede Municipal do Rio de Janeiro, Naira conta que, como os próprios alunos queriam compartilhar o que faziam, e ainda não havia a febre das redes sociais, foi criado um dia especial no qual as turmas se reuniriam no auditório para testar os jogos uns dos outros. “Dessa turma, tenho quatro ex-alunas que escolheram a Matemática na hora do vestibular”, vibra a educadora.
Na ausência de computador e internet, a lição que fica para a professora é que o jogo motiva, entusiasma e faz os alunos aprenderem.
– Essa fórmula foi utilizada com outras turmas da Escola Municipal Alzira Araujo, até que começaram a questionar por que não usávamos os computadores novos. Assim, a ideia saiu do papel para a forma digital – lembra a professora.
Foi a partir desse fato que a professora teve a atenção despertada para a possibilidade de se usar games no aprendizado da Matemática durante as aulas.
– Como os jogos de tabuleiro funcionaram tão bem, pensei em começar a utilizar um site com desafios matemáticos chamados Matematrix. Eu atualizava os desafios semana a semana e copiava os arquivos em cada uma das máquinas do então novo laboratório da escola, ainda sem acesso à internet. Mais tarde, alguns aplicativos off-line foram instalados nos computadores da escola e comecei a utilizar joguinhos, principalmente quando trabalhava Teorema de Pitágoras e outros conceitos em que o visual fazia toda a diferença. O difícil era retirar os alunos do laboratório. Quando passamos a ter internet, em meados de 2006, começamos a arriscar com alguns jogos on-line disponíveis, mas em poucas aulas, pois levar uma turma de 45 alunos para o laboratório só foi possível por meio da parceria com a então professora da sala de leitura, Maria Lecy. Por conta disso, resolvi voltar à faculdade e cursar Licenciatura em Computação. Nunca mais consegui desatrelar o binômio educação/tecnologia de minha vida profissional – confessa Naira Lemos.
Nativos digitais
Algum tempo depois, a mestra ingressava no Grupo de Professores de Matemática, com o objetivo de criar aulas digitais para a Educopédia.
– Daí em diante, passamos a buscar objetos de aprendizagem sobre cada um dos temas das aulas. A maior parte eram justamente os jogos. Como saber se um ou outro jogo era adequado mesmo? Passei a levar as aulas que construía para a sala de aula, ainda na Alzira Araujo. Na época, começamos com um projeto-piloto da Educopédia na escola e tínhamos evoluído, tínhamos um ponto de internet na sala da turma que vinha a ser observada. Eu levava meu notebook, pegava o data show do colégio e utilizava os games com a turma – recorda.
De acordo com estudiosos do tema, as novas gerações nascidas em plena Sociedade do Conhecimento, os chamados “nativos digitais”, são diferentes das anteriores. Dessa forma, as escolas precisam se adequar a este novo perfil de aluno. Por isso, tirar proveito pedagógico da tecnologia sempre foi a intenção de Naira, apesar de nunca ter sido fã dos jogos eletrônicos nas horas de folga.
– Por que não lançar mão do lúdico dentro da sala de aula? Se os alunos já vivem num mundo digital, como podemos continuar em aulas exclusivamente analógicas? – questiona ela.
Estas eram perguntas que ela se fazia o tempo inteiro, e as respostas chegaram ao passo que pôde identificar o potencial dos games para estimular o aprendizado.
– Nas aulas em que eu lançava mão de jogos eletrônicos, com auxílio de data show, percebi que conseguia prender a atenção até dos mais dispersos. O desempenho nas avaliações melhorou justamente nas questões que abordavam temas nos quais havia utilizado jogos para reforçar os conceitos – constata a professora.
Porém, a simples troca do lápis e papel pelo computador começou de fato, no entender de Naira Lemos, em 2004, quando a escola teve o seu laboratório de informática instalado, e a então diretora, Maria Helena, lançou a ela o desafio de colocar a nova instalação para funcionar, já que Naira era uma iniciada em computação na época.
– Aceitei o desafio e meus alunos também. Aliás, eles aceitaram e curtiram. Queriam levar os games de Matemática que estavam instalados nos computadores para jogar em casa, na lan house, na casa do colega. Tudo isso me motivou a apostar nos jogos educativos como ferramenta para melhorar o desempenho das turmas. Se os analógicos davam bons resultados, imagine então os digitais. Esta era a realidade deles fora dos muros da escola – confessa a especialista.
Jogo de cintura
O uso de tecnologia tem se tornado um importante aliado dentro da sala de aula. Mas, para viabilizar tudo isso, na opinião de Naira, é preciso ter jogo de cintura e ser insistente, pois muitas vezes o professor planeja uma aula e, na hora, os recursos tecnológicos não funcionam. Ela recomenda ter sempre uma carta na manga.
– Ainda não possuímos a estrutura ideal, mas se mostrarmos que este caminho vale a pena e dá resultados, sem dúvida chegaremos a uma realidade mais adequada. Na sala de aula, podemos explorar os jogos utilizando data show; os alunos divididos em grupos vibram e opinam juntos. Muitos deles pedem o link e continuam manuseando em casa. Quer satisfação maior que esta? O aluno, sem perceber, está pedindo uma tarefa de casa do assunto que você quer que ele estude – comenta a professora.
Mesmo transformado em uma realidade, o aprendizado de Matemática com auxílio de games, segundo Naira Lemos, nunca foi uma unanimidade.
– Muitos olharam com desconfiança, talvez até tenham apostado no fracasso da experiência. Mas o meu termômetro sempre foi o aluno, e ele me entusiasmava a continuar tentando.
Com o apoio de seu público-alvo preferencial, a novidade começou a influenciar no desempenho individual e coletivo da disciplina.
– Alguns alunos que não gostavam muito de Matemática passaram a me “perseguir” pelo corredor para saber como jogar mais. Isso os fez participar mais das aulas e refletiu positivamente em seu rendimento. Nas turmas em que o trabalho pedagógico era complicado, em dias de aula com jogos digitais o clima era muito mais favorável. Aliás, estas eram as turmas que mais vibravam – comemora Naira.
Para ela, o reconhecimento externo dessa nova prática é o que menos importa. Em sua opinião, se o professor lançou mão de jogos digitais ou outras estratégias didáticas que apresentaram melhora no desempenho, este reconhecimento vem naturalmente dos próprios alunos. Mas Naira Lemos faz uma ressalva a respeito de games como a fórmula mágica para os problemas que os professores enfrentam no dia a dia, durante o ensino/aprendizagem da disciplina.
– Após algum tempo, aprendi que não existe aquela fórmula mágica na educação – todos nós sabemos disso. Muitas vezes, uma estratégia didática que surtiu um efeito extraordinário em um grupo pode não apresentar o mesmo impacto em outro. O professor precisa tentar estratégias diversas e descobrir qual o melhor caminho a seguir com aquela turma. Os jogos digitais estão longe de ser a fórmula de sucesso. Bons resultados com os alunos podem ser obtidos de formas variadas. O importante é conquistar o estudante para a Matemática – finaliza Naira Cristina Vieira Lemos de Oliveira.