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Helena Antipoff, uma abordagem pioneira na Educação Especial no Brasil
25 Março 2019 | Por Carla Araújo
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Helena Antipoff em 1930 (Acervo: Centro de Documentação e Pesquisa Helena Antipoff)

Com uma abordagem pioneira na Educação Especial no Brasil, a pedagoga e psicóloga russa Helena Antipoff fixou residência em Belo Horizonte, em 1929, a convite do governo do estado de Minas Gerais. Com formação universitária em Paris e Genebra, a educadora ficou conhecida, também, pelo trabalho na educação básica e rural.

Helena Wladimirna Antipoff nasceu em 25 de março de 1892, na cidade de Grodno, na Rússia czarista (hoje Hrodna, na Bielorrúsia). Filha do General Antipoff e da professora de Grego Sofia Antipoff, obteve o diploma do Curso Normal, em 1909, em São Petersburgo, e, posteriormente, mudou-se com a mãe para Paris.

Formação e trabalho na França, Suíça e Rússia

Na França, enquanto cursava o bacharelado em Ciências, a jovem Helena frequentou seminários em Sorbonne e passou a desenvolver um interesse pela Psicologia. Após estagiar no Laboratório de Psicologia da Universidade de Paris, mudou-se para Genebra, na Suíça, e estudou no Instituto Jean-Jacques Rousseau (IJJR) – importante centro de estudos em ciências da educação – onde formou-se psicóloga com especialização em Psicologia da Educação.

Sob a orientação do neurologista e psicólogo suíço Édouard Claparède, integrou o primeiro grupo de professoras da Maison des Petits, escola experimental anexa ao IJJR. Na instituição, novos métodos educativos eram elaborados e testados para fomentar as propostas da Escola Nova ou Escola Ativa que faziam parte do movimento de renovação educacional que atravessava a Europa no início do século XX. Essas propostas colocavam a criança como o centro do processo educativo.

Antipoff se formou e trabalhou em locais que pregavam a autonomia do aluno para conduzir o processo de aprendizagem, que prezavam o respeito às diferenças individuais e que se preocupavam com a educação pela paz e os efeitos da Primeira Guerra Mundial em estudantes e professores.

Após o período em Genebra, a educadora retornou à Rússia em busca do pai que havia sido ferido em combate na Primeira Guerra. Presenciou a eclosão da Revolução Russa, em outubro de 1917, e passou a trabalhar em estações médico-pedagógicas, nas cidades de Vyatka (hoje Kirov) e São Petersburgo, a fim de elaborar o diagnóstico psicológico das crianças que haviam perdido as famílias e planejar atividades de reeducação.

Na década de 1930, a educadora com o neurologista e psicólogo suíço Édouard Claparède (Acervo: Centro de Documentação e Pesquisa Helena Antipoff)

Como colaboradora do Laboratório de Psicologia Experimental de Petersburgo, publicou estudos que desagradaram as autoridades soviéticas. Na mesma época, o jornalista e escritor russo Viktor Iretsky, com o qual Helena havia se casado, foi perseguido por ideias consideradas nocivas à revolução. Por essas questões, o casal se exilou em Berlim, em 1924.

Separada do marido, retornou à Suíça para atuar como professora de Psicologia da Criança no Instituto Jean-Jacques Rousseau. Lá, voltou a trabalhar com Édouard Claparède e publicou diversos artigos em periódicos especializados.

Mudança para o Brasil

Em 1929, transferiu-se para Belo Horizonte, a convite do governo de Minas Gerais, para iniciar o ensino de Psicologia na Escola de Aperfeiçoamento de Professores. A instituição havia sido recentemente inaugurada como parte da reforma que visava a formação de professores comprometidos com métodos educativos inspirados na Psicologia.

O contrato de Helena Antipoff previa, também, a coordenação do Laboratório de Psicologia da Escola e a assessoria para a aplicação de testes de inteligência nos estudantes da rede pública. A educadora buscou criar um ambiente de integração entre teoria e prática, combinando o ensino teórico em Psicologia com demonstrações concretas no Laboratório. Para registrar as experiências e estudos, foi criado um acervo de documentação na Escola de Aperfeiçoamento chamado Museu da Criança.

As pesquisas e os testes seriam usados para organizar as chamadas “classes homogêneas”, selecionadas por nível de inteligência. Porém, segundo a psicóloga e professora Regina Helena de Freitas Campos, pós-doutora na Universidade de Genebra e na École des Hautes Études en Sciences Sociales, no artigo Helena Antipoff: razão e sensibilidade na psicologia e na educação, a perspectiva adotada por Antipoff a respeito da psicologia da inteligência se diferenciava da corrente hegemônica da época ao propor uma interpretação em bases socioculturais.

Nessa época, introduziu o termo “excepcional” (em vez de retardado) no vocabulário da Psicologia para se referir às crianças que apresentavam resultados abaixo da zona de normalidade. Para ela, a nova denominação se justificava para evitar a estigmatização e para possibilitar a reversão de distúrbios por meio de medidas psicopedagogas adequadas.

Em conjunto com Maria Luiza de Almeida Cunha, também professora da Escola de Aperfeiçoamento, Helena Antipoff escreveu, em 1932, que “o nível baixo nos testes de inteligência para muitas crianças de meio social inferior e crescidas fora da escola não prognostica absolutamente o futuro atraso nos estudos, pois nesta idade o organismo ainda está bem plástico e o cérebro capaz de assimilar com grande rapidez e eficiência os produtos da cultura intelectual”.

Antipoff em sala de aula na década de 1970 (Acervo: Centro de Documentação e Pesquisa Helena Antipoff)

Essa ideia levou a psicóloga e pedagoga a acreditar no sucesso de programas de educação compensatória e de reeducação para crianças excepcionais. Entre as iniciativas nesse sentido, dedicou-se à criação da Sociedade Pestalozzi de Belo Horizonte em 1932. Sob a presidência de Antipoff, médicos, educadores e religiosos se reuniram com o objetivo de promover o cuidado das crianças excepcionais e assessorar professores de classes especiais.

Fazenda do Rosário

A partir de 1940, inaugurou a Fazenda do Rosário, no município de Ibirité, em Minas, para educar crianças com deficiência ou abandonadas utilizando as teorias da Escola Ativa. Na mesma década, tornou-se professora fundadora da Cadeira de Psicologia Educacional na instituição que viria a ser a Universidade Federal de Minas Gerais.

Durante o Estado Novo, o governo de Minas não renovou o contrato de Antipoff e a educadora mudou-se para o Rio de Janeiro onde trabalhou junto ao Ministério da Saúde na institucionalização do Departamento Nacional da Criança e na criação da Sociedade Pestalozzi do Brasil. Em 1944, engajada na luta pela redemocratização do país, publicou o artigo Como pode a escola contribuir para a formação de atitudes democráticas.

Ao longo dos anos, na Fazenda do Rosário, a psicóloga esteve à frente de um extenso trabalho não só com a Educação Especial, mas também, com a educação rural. Em 1951, finalmente com a cidadania brasileira, retomou as funções como catedrática de Psicologia Educacional e passou a integrar as atividades da Fazenda do Rosário com a comunidade rural do entorno da propriedade.

A partir daí foram criadas diversas instituições que formaram o Complexo Educacional do Rosário, como as Escolas Reunidas Dom Silvério, para o ensino primário; o Clube Agrícola João Pinheiro, para ensino e experimentação de técnicas agrícolas; dois Ginásios Normais, um com internato para homens e outro para mulheres; e o Instituto Superior de Educação Rural (Iser), com cursos de treinamento para professores rurais contando com disciplinas específicas como cultivo de lavouras, hortas e pomares e criação de animais.

Com alunos do Instituto Superior de Educação Rural (Iser) (Acervo: Centro de Documentação e Pesquisa Helena Antipoff)

A pedagogia rosariana privilegiava a cooperação em um ambiente em que o aprendizado deveria se fazer de forma mútua e com liberdade para experimentar. Nessa época, Antipoff passou a incentivar a reunião de estudantes de variados níveis intelectuais e diversos tipos de habilidades nas salas de aula.

O foco na natureza e no ensino rural despertou na educadora uma perspectiva ecológica. Na década de 1950, já alertava os alunos para os problemas decorrentes da exploração descuidada de reservas naturais e do uso predatório do solo. Em discurso como paraninfa dos formandos do Curso Normal Regional Sandoval Soares de Azevedo, na Fazenda do Rosário, em 1958, recomendava "preparar cada um de seus alunos para a alta função de guardião do tesouro terrestre, de zelador do solo".

Superdotação

Também desenvolveu um trabalho em relação a descoberta de talentos e educação de superdotados. Nos últimos anos de vida, fundou a Associação Milton Campos para o Desenvolvimento de Vocações (Adav) dedicada a incentivar esses jovens. Pouco antes de falecer, em 1974, Antipoff recebeu o prêmio Boilesen pelos serviços prestados à educação no Brasil. O valor da premiação foi aplicado na criação da Adav, que passou a receber alunos indicados por escolas públicas da região metropolitana de Belo Horizonte para participar de um programa intensivo de desenvolvimento.

Helena Antipoff faleceu em 9 de agosto de 1974, após 40 anos de residência no Brasil. Aqui colocou em prática a formação científica europeia e as discussões e proposições relativas à defesa das crianças brasileiras. Hoje, a Fundação Helena Antipoff preserva a memória da educadora no município de Ibirité e diversas instituições propagam o trabalho e os ideais da psicóloga e pedagoga em vários estados do Brasil.

Instituto Municipal Helena Antipoff (IHA)

Segundo dados da Secretaria Municipal de Educação do Rio divulgados em janeiro deste ano, existem um pouco mais de quatro mil estudantes na Educação Especial da Rede Pública Municipal de Ensino do Rio. Na SME, os educadores contam com a assistência de profissionais do IHA.

As ações do IHA acolhem alunos com deficiência, com transtornos globais do desenvolvimento/transtornos do espectro autista e altas habilidades/superdotação, e prioriza a inserção dos alunos da Educação Especial em classes comuns. O Instituto assegura o Atendimento Educacional Especializado (AEE) em Salas de Recursos Multifuncionais, realiza o acompanhamento das Classes Hospitalares e promove ações de formação inicial e continuada para os profissionais.

Um exemplo de formação continuada do IHA é a série produzida em parceria com a MultiRio na qual profissionais do Instituto falam sobre o trabalho realizado e levantam questões envolvendo surdez, deficiência visual e superdotação.

Fontes:
Site Fundação Helena Antipoff;
Site Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro;
CDPHA – Centro de Documentação e Pesquisa Helena Antipoff;
Helena Antipoff: razão e sensibilidade na psicologia e na educação, de Regina Helena de Freitas Campos;
Dicionário de educadores no Brasil: da Colônia aos dias atuais, de Maria de Lourdes Fávero e Jader de Medeiros Britto (organização);
As Classes Especiais e Helena Antipoff: uma Contribuição à História da Educação Especial no Brasil, de Adriana Araújo Pereira Borges;
Desenvolvimento mental das crianças de Belo Horizonte, de Helena Antipoff;
Test Prime (Boletim 10), de Helena Antipoff e Maria Luiza de Almeida Cunha.

 
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