ACESSIBILIDADE
Acessibilidade: Aumentar Fonte
Acessibilidade: Tamanho Padrão de Fonte
Acessibilidade: Diminuir Fonte
Youtube
Facebook
Instagram
Twitter
Ícone do Tik Tok

Funções executivas cerebrais
08 Maio 2019 | Por Larissa Altoé
Compartilhar pelo Facebook Compartilhar pelo Twitter Compartilhar pelo Whatsapp

 

Crédito: Pixabay

O cérebro aprendiz é capaz de ir bem além do que apenas memorizar conteúdos. Podemos desenvolver funções cerebrais que nos garantam criatividade, flexibilidade, autocontrole e disciplina.

Funções executivas cerebrais são habilidades essenciais para a saúde mental e física e para o desenvolvimento cognitivo, social e psicológico, segundo a pesquisadora Adele Diamond, responsável pelo Departamento de Neurociência do Desenvolvimento Cognitvo da Universidade British Columbia, em Vancouver, no Canadá, no artigo Executive Functions, publicado no Annual Review of Psychology. “O raciocínio, a resolução de problemas e a capacidade de planejamento são construídos a partir dessas funções. Além disso, elas formam um conjunto de processos mentais necessários à concentração e importantes para momentos em que estar no modo automático ou confiar no instinto não é aconselhável, é insuficiente ou impossível”, explica.

No Brasil, os pesquisadores do Laboratório de Automação de Sistemas Educacionais da UFRJ – Labase – acreditam que as funções executivas cerebrais são a chave para uma nova pedagogia, que privilegie ensinar crianças a aprender e não apenas a memorizar informações. O novo projeto pedagógico proposto pela Universidade se dá por meio de games computadorizados e está sendo testado em duas escolas da 6ª CRE: E.M. Jornalista e Escritor Daniel Piza, em Costa Barros, e E.M. Charles Anderson Weaver, em Coelho Neto.

“Atualmente, os esforços para estimular as funções executivas cerebrais no modelo tradicional de escola são paliativos. É preciso uma mudança de paradigma. Os professores da escola do século XXI deveriam atuar como mediadores experientes, orientando os alunos a proporem problemas em conjunto, baseados na realidade objetiva, e a buscarem soluções para os mesmos. Para isso, todas as disciplinas deveriam ser usadas, assim como recursos de pesquisa – internet, livros etc. O objetivo é ensinar o jovem a buscar conhecimento para solucionar questões reais”, defende Carla Verônica Machado Marques, psicóloga, doutora em Engenharia de Sistemas e Computação pela Coppe/UFRJ e pesquisadora no Labase.

Computação cognitiva

A tese de doutorado de Carla Verônica é sobre computação cognitiva – uma iniciativa pioneira nessa área. “Sabe-se, atualmente, que cada cérebro é único. Há semelhanças entre os cérebros humanos, assim como há entre olhos, bocas e orelhas. Do mesmo modo, há diferenças. Cada cérebro é único, assim como cada indivíduo, mesmo que seja gêmeo univitelino. O desenho que vemos em livros é meramente didático, tem a função de mostrar as estruturas cerebrais comuns. Por isso, precisamos do auxílio da Engenharia de Sistemas e da Computação na Educação, para que possamos atender aos estudantes de forma individualizada e trabalhar seus problemas de aprendizado, caso a caso. O computador é fundamental nesse processo porque captura o perfil do aluno, suas características, suas áreas de força positivas e também os déficits, em milissegundos”.

O projeto pedagógico proposto pela UFRJ está em curso na E.M. Jornalista e Escritor Daniel Piza (Foto: arquivo professora Ana Paula Cavadas)

 

Carla Verônica detalha como a computação pode ajudar na educação. “Especialistas programam a máquina com softwares de captura de dados. É como uma fotografia da atividade cérebro-mente. A criança joga um videogame e a máquina na qual ela está jogando é capaz de colher dados sobre como o seu conjunto cérebro-mente trabalha quando está aprendendo. O software do computador está programado para listar dados importantes em relação à maneira como a criança joga. Os jogos começam com narrativas simples e avançam para histórias mais complexas, conforme se desenvolve a habilidade ao jogar. A experiência tem mostrado que, muitas vezes, crianças que tiram nota máxima em todas as matérias não avançam nas fases do jogo, demonstrando que conseguem decorar o conteúdo, mas não sabem usar a lógica, por exemplo. Há, também, o caso da uma criança que tirava zero, foi expulsa diversas vezes da escola e gabaritou o jogo, demonstrando que usa as funções executivas cerebrais, tais como memória de trabalho, planejamento, atenção, comando, antecipação lógica etc”, afirma a especialista.

De acordo com Adele Diamond, as principais funções executivas cerebrais são três: controle inibitório (incluindo autocontrole e atenção seletiva), memória de trabalho e flexibilidade mental.

Controle inibitório

Envolve ser capaz de controlar a própria atenção, o comportamento, os pensamentos e/ou emoções para inibir uma forte predisposição interna ou atração externa, e fazer o que for mais apropriado ou necessário. Sem controle inibitório, estaríamos à mercê dos impulsos, hábitos de pensamento ou ação (respostas condicionadas) e estímulos do ambiente. Portanto, o controle inibitório torna possível que mudemos e escolhamos como reagimos e como nos comportamos. “Não é fácil. De fato, normalmente somos criaturas de hábitos, e nossos comportamentos estão submetidos ao controle de estímulos ambientais além do que supomos, mas ter a habilidade de exercitar o controle inibitório cria a possibilidade de mudança e escolha”, afirma Adele Diamond.

Memória de trabalho

Outra função executiva cerebral central é a memória de trabalho, ou seja, a capacidade de manter uma informação na mente e usá-la mesmo que ela não esteja mais sensorialmente presente.

A memória de trabalho é crítica para dar sentido a tudo que se desdobra sobre o tempo, para reter na mente o que aconteceu antes e relacionar com o que vem depois. É necessária, portanto, para que a linguagem escrita ou oral tenha sentido, seja uma sentença, um parágrafo ou um período mais longo. Fazer qualquer conta de cabeça também requer memória de trabalho, assim como transformar instruções em ação, incorporar novas informações ao que se pensa ou se faz, considerando alternativas, e relacionar mentalmente informações para derivar um princípio geral ou para ver relações entre itens ou ideias.

A razão não seria possível sem a memória de trabalho. Esta é essencial para nossa habilidade de ver conexões entre o que, aparentemente, não tem ligação, e para a criatividade, porque combina e recombina elementos de novas maneiras. Ela é distinta da memória de curta duração, que envolve apenas a retenção da informação na mente.

A memória de trabalho e o controle inibitório são funções que precisam uma da outra e ocorrem simultaneamente. A memória de trabalho suporta o controle inibitório. Adele Diamond dá um exemplo de atividade escolar para crianças de quatro ou cinco anos que utiliza as funções acima descritas: “Cada criança escolhe um livro ilustrado em parceria com um colega e ambos devem se revezar para contar a história um para o outro. Se cada um está ansioso para falar, ninguém quer ouvir. Para ajudar com o controle inibitório, professores usam um lembrete visual, neste caso, colocando na mão de uma das crianças um desenho de uma orelha, explicando que orelhas não falam; orelhas ouvem. Com essa lembrança concreta, a criança com o ouvido inibe a fala e escuta. Sem o desenho, ela não seria capaz de fazer isso. Depois de poucos meses, a figura não é mais necessária; a criança internalizou a lembrança”.

Flexibilidade cognitiva

Flexibilidade cognitiva é a terceira função executiva central. Baseia-se nas outras duas funções e acontece muito mais tarde no desenvolvimento humano. As habilidades do funcionamento executivo cerebral amadurecem até o final da segunda década de vida.

Um aspecto da flexibilidade cognitiva é ser capaz de mudar de perspectiva espacialmente (como algo pareceria se fosse visto de uma posição distinta?) ou interpessoalmente (pensar em algo do ponto de vista de outra pessoa). Para isso, precisamos inibir nossa perspectiva prévia e carregar a memória de trabalho de um ângulo diferente. É nesse sentido que a flexibilidade cognitiva requer e se baseia no controle inibitório e na memória de trabalho.

Outros aspectos da flexibilidade cognitiva envolvem as capacidades de ajustar o comportamento, reconhecer prioridades, admitir que se está errado, e aproveitar oportunidades.

De acordo com Adele Diamond, essa flexibilidade é valiosa para o professor. “Quando um aluno não está entendendo um conceito, frequentemente reclamamos: ‘se pelo menos ele fosse mais brilhante, entenderia o que estou tentando ensinar’. Poderíamos ser flexíveis e considerar uma perspectiva diferente: o que devo eu, professor, fazer de maneira diferente? Como posso apresentar o material de forma diversa para que, assim, o estudante possa ser bem sucedido?”.

Ainda segundo Diamond, as funções executivas cerebrais ficam prejudicadas se a pessoa estiver estressada, triste, solitária, privada de sono, ou fisicamente fora de forma. Tais situações podem causar desordens nessas funções, como o Transtorno do Déficit de Atenção. A boa notícia é que elas também podem ser melhoradas ao longo de toda a vida. Estudos já demonstraram o efeito benéfico para essa finalidade do treinamento computadorizado, incluindo games; do aprendizado bilíngue na infância; das artes marciais tradicionais; dos exercícios aeróbicos, de modo geral; da meditação e da yoga.

 
Compartilhar pelo Facebook Compartilhar pelo Twitter Compartilhar pelo Whatsapp