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Cena cotidiana da cidade do Rio de Janeiro. Aquarela sobre papel de 1826 (Crédito: Jean-Baptiste Debret/Museus Castro Maya)

A partir da chegada da família real portuguesa e do regente D. João (1767-1826), a ansiedade tomou conta de parte dos habitantes do Rio de Janeiro, cidade que seria transformada em cenário real. Para muitos, os dias pareciam curtos diante das incontáveis possibilidades que se desenhavam no horizonte. O ir e vir das embarcações que atracavam no porto da cidade, repletas de mercadorias e de novidades, parecia não ter fim. No ano de 1808, as chegadas e as partidas alcançariam aproximadamente 855 embarcações – número bastante expressivo para a época.

Além dos indivíduos, aportavam objetos e utensílios trazidos não somente por comerciantes portugueses, mas por caixeiros viajantes ingleses cada vez mais numerosos. Afinal, a Abertura dos Portos ao comércio internacional, assinada por decreto régio na cidade de Salvador, garantia essa movimentação, com o fim do monopólio comercial.

Chegavam ao Rio de Janeiro, trazidas pelas embarcações que cruzavam as águas do Atlântico, pessoas de origens e de características diversas. Franceses, ingleses, espanhóis, alemães, suíços: louros, ruivos, altos, baixos, magros. Alguns católicos, outros não; uns com títulos de nobreza, outros desprovidos deles. Atraídos pelo novo e pelo desconhecido, artistas e cientistas que, atores da cena daqueles tempos, deixaram importantes registros da história da cidade e dos seus moradores, em imagens e em textos.

Esses viajantes estrangeiros trouxeram, também, publicações contendo o pensamento liberal que se espalhava pela Europa na época. Apesar do empenho das autoridades portuguesas, tentando impedir a circulação do que nomeava como sendo “infames ideias francesas” (igualdade, liberdade, fraternidade e felicidade), tal filosofia alcançava a colônia portuguesa na América. Livros, folhetos ou documentos circulavam clandestinamente, trazidos por estudantes brasileiros que frequentavam universidades europeias.

Além disso, outra importante mercadoria, preciosa e lucrativa – escravos vindos da África –, continuava chegando. Se, por um lado, os novos moradores registravam em diários pessoais ou em correspondências a exuberante natureza tropical, a luminosidade dos dias e a variedade das cores e dos tons observados em verde e azul, por outro, ficavam inquietos e amedrontados com a enorme quantidade de cativos espalhados pela cidade. Diziam, em cartas, e porque isso chamava a atenção, que não se sentiam seguros diante de tantos escravos, além dos vadios e dos desocupados. Escreviam que a escravidão estava por toda parte. Referiam-se à visível superioridade numérica dos africanos no Rio de Janeiro, e acrescentavam que na cidade faltava gente branca, luxo e boas estradas. 

Mas nem tudo era motivo de desagrado como os momentos difíceis vividos na longa travessia atlântica. Os recém-chegados informavam, por meio das correspondências, que as águas eram abundantes, assim como as verduras (em falta em Lisboa). Também reconheciam existir regiões lindíssimas muito perto da cidade e onde moravam pessoas da sociedade. Como exemplo, referiam-se ao que os locais chamavam de Baía de Botafogo, que diziam, sem exagero, comparar-se aos mais belos locais da Itália ou da Suíça.